Pescadores de Salamansa
começam a sufocar-se com projectos que dizem nunca sair do papel. Mais
conhecidos como “os habitantes de Santa Luzia”, embarcam todas as semanas rumo
a ilha e só regressam à casa aos fins-de-semana para descarregarem a mercadoria.
Dizem-se abandonados a própria sorte e mostram-se receosos quanto ao futuro.
Todas as
segundas feiras lá vão esses homens fazerem-se ao mar, num exemplo de que quem nunca
perde a esperança. Partem e nunca sabem se regressam, mas assumem os riscos e
as más condições de trabalho, porque não há outro meio de sobrevivência.
Levam cerca
de uma hora ou duas a chegarem à praia, lugar utilizado para colocarem os materiais
e que serve também de refúgio. Normalmente, partem de manhã e só regressam às
16 horas. O resto do dia é passado ao relento, sem um teto onde se abrigarem e
sem água, visto que a única fonte que existia no local foi, segundo os
pescadores, entupida por um grupo de estudantes que foi visitar a ilha.
“Nós
enfrentamos imensas dificuldades, e o caso agrava-se quando se trata de
satisfazer as nossas necessidades básicas.” Desabafa Daniel Davide, pescador.
“Há mais de 20 anos que ouvimos falar na construção da casa. Da última vez foi
na época das eleições legislativas em que veio aqui um arquitecto perguntar-nos
como é que gostaríamos que fossem as portas e as janelas da casa”.
E os
problemas não terminam por aqui, “infindados” em promessas que nunca chegaram a
acontecer. O próximo é a reabilitação do poço que lhes servia como uma espécie
de substituto a água potável e que até agora não foi solucionado. Segundo o
presidente da associação de pescadores da aldeia, Alfredo Bandeira, foi-lhes
prometido a construção de um esterilizador de água há mais de dois anos, em
princípio, com uma capacidade de 75 litros de água, mas que ainda estão a
espera.
“Por vezes
vimo-nos obrigados a permanecer com as mesmas roupas. Não há como ser de outra
forma, ainda por cima nos dias de chuva, a levar com aquilo tudo em cima” ,admite
Humberto Matias, pescador.
O ambiente
que ronda aquela “aldeia dos pescadores” é de total descrédito e dizem-se
“fartos” de tantas promessas. O A NAÇÃO tentou entrar em contacto com o
Instituto Nacional de Desenvolvimento das Pescas, mas não obteve nenhuma
resposta.
Pesca ilegal/fiscalização
Mas ainda
há mais. A questão da fiscalização da orla marítima daquela região está a
preocupar os pescadores, que encaram isso como uma ameaça ao futuro, cada vez
mais próximo, com o perigo de se dissipar a única fonte de rendimento de que dispõem.
De
acordo com o presidente da associação dos pescadores do Calhau, João Melo, estes
trabalhadores estão conscientes de que os recursos estão a esgotar-se, “A
pressão que se está a exercer sobre aquela ilha é extremamente penalizante.
Defendo que deveria haver mais fiscalização relativamente aos processos de
pesca praticados, porque são práticas erradas, proibidas por lei, mas que
infelizmente não são respeitadas.
Ao
que o A NAÇÃO apurou, várias pessoas, vindas de São Pedro e de Santo Antão,
procuram a região para pescar. Os conflitos começam a surgir quando a
concorrência em volta torna-se desleal. Enquanto há pescadores que praticam a
pesca artesanal, há outros que utilizam redes de malha, ou utilizam a técnica
do mergulho por meio de espingardas para a captura.
Guarda Costeira e
Polícia Marítima de mãos atadas
O
A NAÇÃO foi saber junto dos responsáveis pela fiscalização em que pé anda o
problema neste momento e, segundo o que se constatou, a situação não é das
melhores. De um lado temos a polícia marítima que se diz “manietada”por falta
de recurso, do outro temos a guarda costeira, que mesmo em activo, também
mostra-se vulnerável no que tange a equipamentos, facto que limita o desempenho
das suas funções.
Segundo
o Comandante da Esquadrilha Naval, Pedro Santana, enfrentam graves problemas em
termos de equipamentos, “Todos os mares de Cabo Verde precisam de mais
fiscalização, mas para que isso aconteça temos que ter navios operacionais e
não há nada que custe mais dinheiro do que a fiscalização”.
Dos dois barcos existentes no Porto Grande, só
um encontra-se em funcionamento. O “Vigilante” que possui cerca de 40 anos está
avariado desde Julho do corrente. “Parte
dos navios da Guarda Costeira possuem uma idade um pouco avançada. Além disto
existe uma dificuldade acrescida que é a o facto das das máquinas serem russas
e da Alemanha oriental o que dificulta e encarece a aquisição de peças
sobressalentes”, afirma o comandante.
E quando a situação não
poderia estar pior, vem a polícia marítima que se diz limitada pela lei e pela
ausência de recursos e que por isso não consegue desempenhar as suas funções.
“Neste
momento, encontramo-nos manietados por falta de recursos”, reconhece o comandandante
da polícia nacional, Manuel Monteiro. “ Nós estamos limitados por lei, não
detemos determinadas competências que deveríamos ter. Estamos a andar as
cambalhotas desde que aconteceu esta mudança de paradigmas e a polícia marítima
passou a fazer parte da Polícia Nacional”.
Enquanto isso
Com
os recursos a escassearem-se e com a falta de melhores condições de trabalho, a
situação complica-se para o lado dos pescadores. “Por vezes passamos uma semana
no mar, enfrentamos o mau tempo e regressámos sem nada. Passamos fome, e não há
ninguém que olhe por nós. Ficamos aqui a olhar para a cara uns dos outros”,
desabafa Daniel.
Enquanto
isso, fica-se a espera de melhores dias para esses homens do mar, que abdicam
de estar com as suas famílias para se irem aventurar contra as marés. Uma
questão de sobrevivência.
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