sábado, 5 de novembro de 2011

Pescadores cansados de tantas promessas



Pescadores de Salamansa começam a sufocar-se com projectos que dizem nunca sair do papel. Mais conhecidos como “os habitantes de Santa Luzia”, embarcam todas as semanas rumo a ilha e só regressam à casa aos fins-de-semana para descarregarem a mercadoria. Dizem-se abandonados a própria sorte e mostram-se receosos quanto ao futuro.
Todas as segundas feiras lá vão esses homens fazerem-se ao mar, num exemplo de que quem nunca perde a esperança. Partem e nunca sabem se regressam, mas assumem os riscos e as más condições de trabalho, porque não há outro meio de sobrevivência.
Levam cerca de uma hora ou duas a chegarem à praia, lugar utilizado para colocarem os materiais e que serve também de refúgio. Normalmente, partem de manhã e só regressam às 16 horas. O resto do dia é passado ao relento, sem um teto onde se abrigarem e sem água, visto que a única fonte que existia no local foi, segundo os pescadores, entupida por um grupo de estudantes que foi visitar a ilha.
“Nós enfrentamos imensas dificuldades, e o caso agrava-se quando se trata de satisfazer as nossas necessidades básicas.” Desabafa Daniel Davide, pescador. “Há mais de 20 anos que ouvimos falar na construção da casa. Da última vez foi na época das eleições legislativas em que veio aqui um arquitecto perguntar-nos como é que gostaríamos que fossem as portas e as janelas da casa”.
E os problemas não terminam por aqui, “infindados” em promessas que nunca chegaram a acontecer. O próximo é a reabilitação do poço que lhes servia como uma espécie de substituto a água potável e que até agora não foi solucionado. Segundo o presidente da associação de pescadores da aldeia, Alfredo Bandeira, foi-lhes prometido a construção de um esterilizador de água há mais de dois anos, em princípio, com uma capacidade de 75 litros de água, mas que ainda estão a espera.
“Por vezes vimo-nos obrigados a permanecer com as mesmas roupas. Não há como ser de outra forma, ainda por cima nos dias de chuva, a levar com aquilo tudo em cima” ,admite Humberto Matias, pescador.
O ambiente que ronda aquela “aldeia dos pescadores” é de total descrédito e dizem-se “fartos” de tantas promessas. O A NAÇÃO tentou entrar em contacto com o Instituto Nacional de Desenvolvimento das Pescas, mas não obteve nenhuma resposta.
Pesca ilegal/fiscalização
Mas ainda há mais. A questão da fiscalização da orla marítima daquela região está a preocupar os pescadores, que encaram isso como uma ameaça ao futuro, cada vez mais próximo, com o perigo de se dissipar a única fonte de rendimento de que dispõem.
De acordo com o presidente da associação dos pescadores do Calhau, João Melo, estes trabalhadores estão conscientes de que os recursos estão a esgotar-se, “A pressão que se está a exercer sobre aquela ilha é extremamente penalizante. Defendo que deveria haver mais fiscalização relativamente aos processos de pesca praticados, porque são práticas erradas, proibidas por lei, mas que infelizmente não são respeitadas.
Ao que o A NAÇÃO apurou, várias pessoas, vindas de São Pedro e de Santo Antão, procuram a região para pescar. Os conflitos começam a surgir quando a concorrência em volta torna-se desleal. Enquanto há pescadores que praticam a pesca artesanal, há outros que utilizam redes de malha, ou utilizam a técnica do mergulho por meio de espingardas para a captura.

Guarda Costeira e Polícia Marítima de mãos atadas
O A NAÇÃO foi saber junto dos responsáveis pela fiscalização em que pé anda o problema neste momento e, segundo o que se constatou, a situação não é das melhores. De um lado temos a polícia marítima que se diz “manietada”por falta de recurso, do outro temos a guarda costeira, que mesmo em activo, também mostra-se vulnerável no que tange a equipamentos, facto que limita o desempenho das suas funções.
Segundo o Comandante da Esquadrilha Naval, Pedro Santana, enfrentam graves problemas em termos de equipamentos, “Todos os mares de Cabo Verde precisam de mais fiscalização, mas para que isso aconteça temos que ter navios operacionais e não há nada que custe mais dinheiro do que a fiscalização”.
 Dos dois barcos existentes no Porto Grande, só um encontra-se em funcionamento. O “Vigilante” que possui cerca de 40 anos está avariado desde Julho do corrente.Parte dos navios da Guarda Costeira possuem uma idade um pouco avançada. Além disto existe uma dificuldade acrescida   que é a o facto das das máquinas serem russas e da Alemanha oriental o que dificulta e encarece a aquisição de peças sobressalentes”, afirma o comandante.
E quando a situação não poderia estar pior, vem a polícia marítima que se diz limitada pela lei e pela ausência de recursos e que por isso não consegue desempenhar as suas funções.  
“Neste momento, encontramo-nos manietados por falta de recursos”, reconhece o comandandante da polícia nacional, Manuel Monteiro. “ Nós estamos limitados por lei, não detemos determinadas competências que deveríamos ter. Estamos a andar as cambalhotas desde que aconteceu esta mudança de paradigmas e a polícia marítima passou a fazer parte da Polícia Nacional”.
Enquanto isso
Com os recursos a escassearem-se e com a falta de melhores condições de trabalho, a situação complica-se para o lado dos pescadores. “Por vezes passamos uma semana no mar, enfrentamos o mau tempo e regressámos sem nada. Passamos fome, e não há ninguém que olhe por nós. Ficamos aqui a olhar para a cara uns dos outros”, desabafa Daniel.
Enquanto isso, fica-se a espera de melhores dias para esses homens do mar, que abdicam de estar com as suas famílias para se irem aventurar contra as marés. Uma questão de sobrevivência.

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